sábado, 7 de julho de 2012

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Sabado a tarde.
Ele adentra às espessas portas e encontra-se perdido perante a vastidão que o inunda; choca.
Caminha no vão central que se abre à sua frente.
A multidão o olha com olhos de repulsa; de rejeição.
Sorte estar acostumado a isso e até achar carinho nesse modo de ser olhado, afinal o tempo o fez perceber que mesmo na repulsa havia o carinho de um olhar.
Continuava adentrando sorrateiramente, em passos mansos e vagarosos.
Olhares curiosos o permeavam e sorrisos, quando não pequenos risos, juvenis o engrandeciam e quase o enchiam do tamanho deste lugar, restando-lhe frestas entre toda sua pompa e as colunas que o cercam.
A curiosidade e o espanto debatiam-se em seu ser, que não mais controlava seus pequenos olhos, famintos pelo mundo que se abria para ele e, aqueles que tanto o notavam restava-lhes um repouso esquecido em seu relance.
Talvez as crianças menos.
Gostava do jeito que os pequenos olhos - assim como os seus - o enxergavam.
Mesmo notando que já era visto por todos e abominado por muitos.
Mas sabia, ou ao menos sentia, que todos esses eram deveras pequenos perante aquele local, aquele teto, aquelas crianças.
Não tinha mais como não notá-las.
Ou mesmo adorá-las.
Tornaram-se seus escudeiros neste lugar onde os olhares maiores o dizia profanar.
Continuava andando e avançando. Contornando aquelas pernas, olhos e sorrisos. Por maiores que fossem suas curvas e contornos não conseguia escapar aos olhares.
Chegava ao meio e não podia mais ignorar a atenção que despertara.
Surgia-lhe uma insegurança de estar ali.
Sabia que os bochichos despontavam aos lados e atrás dele, mas prosseguia.
Entendia que voltar seria inútil uma vez que de lá seria banido mesmo, e daí só lhe restaria voltar, por mais forçado que fosse para tal.
Sendo assim, que ele adentrasse ao mais fundo possível para que na fuga tivesse mais tempo de rever todos aqueles detalhes.
"Como os homens podem fazer coisas que até um cão fica tão chocado?
Como poderiam olhos grandes criarem tamanhas coisas que só fariam por fazê-los sentirem-se tão pequenos, mas que mesmo assim, olham-me tão severamente engrandecidos?
E os pequenos?
Estes que surgem-me tão inocentemente aumentados aqui ao ponto de preencherem toda a vastidão deste local; tomam a atenção dos vitrais, das colunas, pilastras, estátuas e das belíssimas pinturas que adornam partes que, mesmo olhos acostumados, não o percebem; olhares pequenos que, como o meu, se conectam a imensidão do desconhecido e do inacreditável, justamente por não terem sido adestrados na arte "consciente" de ver; olhos pequeninos que preenchem até mesmo a vida esvaziada dos grandes olhares."
Chega por fim a frente da catedral e percebe-se de fronte as principais formas do ambiente.
Percebe isso pela condição física e decorativa de todo o resto.
Conduz seus olhinhos para o grande foco deste lugar e se depara com um homem.
Frustrado, espera ser tocado para fora mais isso não acontece. Todos olham-no agora. Até o regente. Ele se tornou o centro dos olhares. Embora decepcionado, com uma pequena satisfação por este feito, vira o rabo e volta-se triunfante para a porta. Um retorno rápido, ao menos para sua percepção assim o fora, agora tão desapontado com o próprio ato de olhar. Não ve o tempo passar e já encontra-se do lado de fora. Todos deram-lhe passagem e mesmo sem ter olhado para dentro, sabia que olhares ainda o seguiam. E que outros ainda o ficaram olhando-o sumir de vista, e até mais. Uns o invejavam, outros o esperavam voltar, pois os que o repudiavam já deixaram de olhar a muito tempo e atinham-se agora a resmungões.
Mas tinham ainda uns poucos que ficaram intrigados e tamanha foram as indagações que também sairam, e juntando-se à outros cães, tornaram seus próprios olhos também pequenos.

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